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ATA DA SESSÃO SOLENE DA POSSE DE JOSÉ GERALDO PAREDES e JOSÉ PEREIRA DA SILVA, EM 06 DE OUTUBRO DE 1999

 

Aos seis dias do mês de outubro do ano de mil novecentos e noventa e nove, na Rua São Francisco Xavier, 524, térreo, na Capela Ecumênica da UERJ, às l6,00 horas, foi realizada a sessão solene de posse de José Geraldo Paredes e de José Pereira da Silva na Academia Brasileira de Filologia. Aberta a sessão, O Sr. Presidente, Leodegário Amarante de Azevedo Filho, constituiu a mesa diretora dos trabalhos com o Segundo Secretário, Manoel Pinto Ribeiro, o Vice-Presidente, Evanildo Bechara, e com os Professores José Paredes e José Pereira da Silva. O Prof. Leodegário agradeceu a presença dos professores Geraldo Pinto Vieira e Daniel Ferreira Martins, do Colégio Pedro II., e do Prof. Cláudio Cezar Henriques, acadêmico e Diretor do Instituto de Letras da UERJ.A seguir, foi dada a palavra ao Prof. Horácio Rolim de Freitas que proferiu o seguinte discurso de saudação ao Prof. José Paredes: “Digníssimo Presidente da Academia Brasileira de Filologia, Prof. Dr. Leodegário Amarante de Azevedo Filho, Ilustres Acadêmicos, Prezados familiares do Prof. José Geraldo Paredes, Minhas senhoras e Meus senhores. É notório que a Academia Brasileira de Filologia tem por objetivo precípuo o estudo da Língua Portuguesa e todos os assuntos pertinentes à Filologia, como determinam o Estatuto e o Regimento. Explicita o Art. 4º do Estatuto: “É condição indispensável para ser admitido membro efetivo ter o candidato publicado obra de reconhecido valor filológico.” Sábia exigência que impede que nela ingressem aventureiros da cultura, políticos e gramatiqueiros, defensores da oralidade em detrimento dos textos e de sua interpretação que só o filólogo preparado é capaz de fazê-lo. É com júbilo, pois, que hoje tenho a tarefa de recepcionar um candidato que preenche os ditames da cultura, amante que é do idioma nacional e batalhador das lides filológicas. Refiro-me ao Prof. José Geraldo Paredes. Amigo e colega de longa data, digno de admiração como homem de caráter retilíneo, professor dedicado, conhecedor dos princípios pedagógicos, talhado para o magistério. Trabalhador espartano, não mede esforços para alcançar os objetivos almejados. Sua palavra é lei, o que o faz merecedor de irrestrita confiança. Amigo sincero, não se lhe arrefece o desejo de justiça em defesa daqueles que a ele recorrem. Pode-se dizer que Paredes se rege pelo lema: “O dever acima do lazer”. Pude constatar seu fervor ao trabalho e à educação dos jovens, quando lecionamos no memorável Colégio Estadual Prof. José Accióli. Ali foi Paredes Coordenador e, por vezes, o saudoso diretor Antonio Travessos, lhe confiava a direção do Colégio. Tudo funcionava. Plena integração entre corpo docente e corpo discente. Quão distantes estamos daquela época dos anos sessenta em que o Estado do Rio de Janeiro mantinha colégios que disputavam a primazia de serem os melhores na rede de ensino. Professores selecionados por concursos públicos de provas e títulos, não provas de múltipla escolha à semelhança dos cartões das casas lotéricas, mas dissertativas, além da prova de aula. Professores que sabiam ensinar e sabiam o que ensinar. Com o passar do tempo, a seriedade deu lugar à incompetência, à negligência e à antipedagogia. Os professores eram conhecidos como “sacerdotes do magistério”. Hoje, tal expressão, se dita, justificará a famosa frase de Horácio na Arte Poética: “Risus teneatis, amici?- Podeis conter o riso? Paredes representa aquela cepa de mestres não só forrado do conhecimento das línguas portuguesa e latina, como também preocupado com os princípios pedagógicos, formado que é em Pedagogia, visando ao objetivo maior: o aluno. Desnecessário seria falar dos frutos de sua labuta no magistério, dos inúmeros jovens que usufruíram de suas orientações e ensinamentos, hoje vitoriosos na vida. Não posso calar um dos exemplos significativos que presenciei no Colégio Marista São José. Aquele tradicional educandário, sob orientação dos padres maristas, teve na gestão pedagógica do Prof. Paredes, possivelmente, sua época de glória. Sabia unir o conhecimento, o educar e o ensino calcados em bases salutares e eficientes da Pedagogia, que resulta em auxílio indispensável àqueles que dela sabem extrair os princípios norteadores que dão equilíbrio e domínio à mente e ao comportamento social e ético, como a lição socrática: Não se trata de um elogio fugaz, mas de fato que rememoro com alegria. Convidado por Paredes, lá fui realizar uma palestra sobre Castro Alves. De início, já me chamaram a atenção o interesse e o silêncio com que os alunos me ouviam. Admirado realmente fiquei, quando, para ilustrar minha falação sobre Castro Alves, um dos alunos recitou o Navio Negreiro completo, de cor, com ênfase métrica, voz audível, como se estivesse eu a ver o jovem poeta baiano a fazê-lo. Marcou-me tal ocasião, e jamais a esqueci. Com vão longe esses tempos! O Prof. Paredes milita no magistério há 12 anos, nos ensinos médio e superior. Lecionou Latim nos Cursos da CADES, Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário, promovidos pelo Ministério da Educação e Cultura, levando atualização do conteúdo das disciplinas e a respectiva didática aos professores das cidades em que não havia Faculdade de Filosofia. É uma referência preciosa. Só os bons eram indicados; só os melhores continuavam. Paredes, obviamente, era um deles. Lecionou nos colégios Republicano, Atheneu São Luiz, Escola Técnica Comercial Rio Grande do Sul, Colégio Estadual José Pedro Varela, Colégio Almirante Saldanha da Gama, pertencente este ao Ministério da Marinha. Dirigiu o Colégio Estadual Pero Vaz de Caminha, fundou e dirigiu a Escola Normal Nerval de Gouveia. No ensino superior, lecionou na SUAM, Sociedade Unificada de Ensino Superior Augusto Motta e na Universidade Santa Úrsula. Sempre atualizado com os modernos estudos, fez inúmeros cursos de aperfeiçoamento no campo lingüístico, no pedagógico e no administrativo. Participou de vários congressos de Língua e Literatura, de Cultura Greco-Latina, de legislação de ensino. Em 1977, submeteu-se a concurso público para obtenção do título de Doutor em Letras e de Livre-Docente em Língua Portuguesa. Seguro e competente, defendeu sua tese diante de uma Banca formada pelos professores: Celso Cunha, Olmar Guterres da Silveira, Abílio de Jesus, Jayr Calhau e eu. Seu trabalho intitulado: Recursos Expressivos da Adjetivação nos Sonetos de Bocage na Fase do Desalento e da Frustração mereceu aprovação e elogio dos examinadores. Nesse estudo, Paredes demonstra possuir a veia filológica. Vale-se da Estilística Descritiva ou Expressiva, para usar a denominação de Pierre Guiraud, Estilística que reve em Charles Bally seu grande teórico. Paredes utiliza os princípios descritos no Traité de stylistique française onde Bally expõe seus objetivos. Paredes extraiu da obra bocagiana os recursos expressivos do adjetivo que o comparam a Camões, aliás seu ídolo, como o próprio poeta o declarou, e se pode observar nesta passagem de um soneto: “Modelo meu tu és... Mas, da tristeza!...Se te imito nos transes da ventura, Não te imito nos dons da natureza!” Paredes, inclusive, em sua obra faz um estudo comparativo da expressividade do adjetivo nos dois poetas. Obra agradável de se ler, não só por se tratar do admirável sonetista português, mas também pelo trabalho perspicaz do filólogo que o realiza. Cabe aqui lembrar o Patrono da Cadeira nº 39, o poeta cearense JOSÉ DE ABREU ALBANO que, no dizer de Clóvis Monteiro, era um quinhentista no século XX. Possui certa semelhança com Bocage, no que concerne à frustração de vida, confessada pelo próprio José Albano nesta passagem: “Tudo que sinto e padeço. Posso descrever assim: O prazer não tem começo/ E a tristeza não tem fim”. Ardoroso amante de nossa língua, da qual dizia “em que mel com aroma se mistura”, dedicou-lhe um poema Ode à Língua Portuguesa. Eis dele uma estrofe: “Quanta e quamanha dor me surge e nasce/ De nunca ouvir aquele antigo estilo. Mas eu fiz que ele aqui se renovasse,/Para que o mundo assim pudesse ouvi-lo. E com todo o poder de engenho e d’arte/ Foi sempre o meu desejo/ Ver-te qual te ora vejo - e celebrar-te”. O trabalho meritório do Prof. José Geraldo Paredes, por décadas, além do reconhecimento de seus alunos e colegas, foi enaltecido por entidades governamentais. Foi agraciado com a medalha Anchieta, pelo Estado da Guanabara; com a medalha Tamandaré, pelo Ministério da Marinha; e com a medalha Tiradentes pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Renovador do ensino no Colégio da Marinha, Paredes teve iluminada idéia de passar para livro sua rica experiência, calcada nos modernos procedimentos de ensino. Deu-nos a obra O Segredo da Redação, publicada em 1995 pela Imprensa Naval, com a 1ª edição esgotada em poucos meses. Na Iª parte da obra, dedicada à redação, encontram-se os capítulos: Virtudes e Vícios de Linguagem, Estrutura Sintática da Frase, Problemas de Construção Frasal, O Parágrafo, Mecanismo de Coesão do Texto, Discurso direto, indireto e indireto livre, Formas de composição. Na IIª parte, trata de Fonema, Acento, Grafia, Hífen, Emprego de Letras e Significado das Palavras, capítulo este que aborda as dificuldades com que mais de deparam os alunos e candidatos a concursos, como: emprego do verbo haver, expressões adverbiais e locuções prepositivas e conjuntivas. Repassa, ainda, concordância, regência, crase, colocação, emprego do infinitivo, pessoas do discurso e plural dos nomes compostos. A IIIª parte consta de exercícios sobre todos os assuntos tratados. Na IVª e última parte, apresenta abreviaturas, emprego de maiúsculas e o Acordo Ortográfico. Além do aspecto didático que Paredes domina como poucos, a obra está fundamentada numa bibliografia sabiamente selecionada, dela constando nomes como: Sousa da Silveira, Walmírio Macedo, Ingedore Villaça, Rodrigues Lapa, Antenor Nascentes, Oiticica, Jesus Belo Galvão, Evanildo Bechara, Celso Cunha e até Bernard Pottier. Honrou-me o pedido para prefaciá-la. Repito o que lá ja afirmara: “Brilhante idéia teve o Prof. José Geraldo Paredes de pôr em obra impressa seus competentes conhecimentos sobre nosso idioma, principalmente quanto ao objetivo apresentado: “proporcionar aos estudiosos os meios básicos na elaboração de textos para a expressão oral e escrita. Pelo valor didático e seguro conhecimento apresentado, trará a obra contribuição inestimável a quantos dela lançarem mão para o domínio prático da língua portuguesa. Aí está o segredo da obra: a capacidade de transmitir do Autor”. Com esta bagagem cultural no campo filológico, pedagógico e lingüístico, a Academia Brasileira de Filologia tem hoje mais um dia de glória por passar a contar em seu meio com um mestre do idioma, um batalhador da filologia que, certamente, trará preciosa colaboração aos empreendimentos que o labor incansável do nosso Presidente traçou, cumprindo o desideratum desta Academia. Prof. Dr. José Geraldo Paredes, sente-se na cadeira do imortal a que tem direito e sinta-se entre os confrades que o recebemos com muita satisfação e alegria.” A seguir, o Prof. José Geraldo Paredes fez o juramento, prometendo cumprir o estatuto da Academia, comparecendo regularmente às sessões e zelando pelo progresso da filologia. Os símbolos da Academia, o capelo e o medalhão foram-lhe entregues, respectivamente, pelos netos Carolina Várzea Paredes e Bruno Várzea Paredes. O neto Pedro Paredes Zambrano Brasil fez a entrega do diploma. A seguir, o novo acadêmico, que ocupará a cadeira número trinta e nove, cujo patrono é José Albano, assim se expressou: “Exmo.Sr. Prof. Dr. Leodegário Amarante de Azevedo Filho, M.D. Presidente da Academia Brasileira de Filologia, Prezados Acadêmicos, Senhoras e Senhores. Somos profundamente grato pela honra que nos fizestes, senhores acadêmicos, elegendo-nos para participar desta Egrégia plêiade de filólogos. Agradecemos àqueles que nos conduziram até este local e de maneira especial ao Ilustre acadêmico Prof. Dr. Horácio Rolim de Freitas pelas palavras afetivas com que nos recebe na Academia Brasileira de Filologia. Na oportunidade, queremos agradecer a Deus o convívio dessa amizade que já nos aproxima há 35 anos. Todos sabemos que V.Exa. é amigo dos amigos. Obrigado por esse momento. Tínhamos que vir aqui para cumprir nossa missão de amante e guardião da Língua Portuguesa e, por isso, vos penhoramos nosso reconhecimento, e também a vós que recebeis e ouvis, por um momento mais, nosso pensamento, nossa palavra. Fomos candidato à vacância da cadeira 39, até então ocupada pelo emérito professor Paulo Lantelme. Reconhecido pela honradez, pela grande figura humana e pelo amor à família, Lantelme deixou-nos a marca de sua personalidade e a de grande educador. No entanto, a timidez, a modéstia não deixavam transparecer a sua cultura, e a sua competência. Dos concursos públicos dos quais tomara parte para professor da Escola Técnica e para professor de primeiro e segundo graus promovido pelo Estado do Rio de Janeiro—obteve o primeiro lugar em ambos, concorrendo com figuras ilustres do cenário lingüístico. Paulo Lantelme ingressou na Universidade Santa Úrsula, como professor, levado pelo acadêmico Prof. Dr. Walmírio Macedo, à época em que a vice-reitoria acadêmica da Universidade era de responsabilidade do eminente Prof. Dr. Antonio José Chediak—o que muito nos honra por termos sido contemporâneo de Paulo Lantelme na Universidade. Agora como o mais novo ocupante da Cadeira 39 desta Casa, cujo Patrono é José Albano, sentimo-nos na obrigação de tecer breve relato de sua personalidade e de sua contribuição à exaltação do culto à Língua Portuguesa. A l2 de abril de l882, nasce em Fortaleza José de Abreu Albano, filho de negociantes e neto, pelo lado paterno dos Barões de Aratanha. De educação esmerada, torna-se aluno do Seminário Episcopal de Fortaleza em 1892 e 1893. Neste último ano, o pai manda-o estudar na Europa, onde freqüenta os melhores colégios: na Inglaterra, o Stonyhurst College, na Áustria, o Colégio Stella Matutina —ambos jesuítas, e na França o Colégio dos Irmãos da Doutrina Cristã. Em l898, regressa da Europa. Faz os preparativos no Liceu do Ceará e bem jovem ainda começa a publicar seus poemas no jornal “A República”. Transfere-se para o Rio de Janeiro, em l902, com o propósito de estudar leis. Interrompe o curso em 1904, e de regresso à província natal, é nomeado professor de Latim no Liceu do Ceará. No ano seguinte, é nomeado pelo Barão do Rio Branco, então Ministro das Relações Exteriores, para trabalhar em seu gabinete no Itamarati. Casa-se em 1906. Em 1908, regressa à Europa para ocupar um cargo no Consulado brasileiro em Londres e lá permanece até 1912. Abandona o emprego no Consulado e viaja por Portugal, Espanha, França, Bélgica, Holanda, Alemanha, Hungria, Suíça, Itália, Romênia, Grécia, Turquia, Palestina, Egito. Em 1914, volta ao Ceará, doente. Restabelecido, muda-se para o Rio de Janeiro, em l917. Freqüenta a Garnier. Convive com Olavo Bilac, Alberto de Oliveira, João Ribeiro, Mário de Andrade dentre outros escritores. Viaja definitivamente para a Europa, estabelecendo-se em Paris. Agrava-se o seu estado de saúde. José de Abreu Albano falece em Montauban, na França, em 11 de julho de 1923. José Albano viveu desligado do seu tempo, dos problemas políticos que agitavam a comunidade brasileira: a Abolição, a República e até mesmo a Campanha dos Canudos. No entanto, em razão de seus estudos na Europa, possuía cultura das mais preciosas, Sabia grego e latim. Conhecia de cor e recitava , em grego, Anacreonte. Horácio era para ele o poeta predileto. Declamava em hebraico os versículos do Cântico dos Cânticos. É nos sonetos onde mais fortemente José Albano expressa o seu caráter lírico—a exteriorização do seu estado psíquico, da sua alma sentimental, do seu destino atormentado. “Soneto: Poeta fui e do áspero destino/ Senti bem cedo a mão pesada e dura./ Conheci mais tristeza que ventura/ E sempre andei errante e peregrino./ Vivi sujeito ao doce desatino/ Que tanto engana mas tão pouco dura; E inda choro o rigor da sorte escura,/ Se nas dores passadas imagino./Porém, como me agora vejo isento/ Dos sonhos que sonhava noite e dia/E só com saudades me atormento;/entendo que não tive outra alegria/ Nem nunca outro qualquer contentamento/ Senão de ter cantado o que sofria.” Albano escrevia e falava fluentemente diversas línguas, como também versejava em francês, inglês e alemão. Em os Four Sonnets —Os quatro sonetos em língua inglesa—pleno de sentimento pela tortura do destino, José Albano expõe a sua angústia em face desse mundo de miséria. Na tradução do terceto do primeiro desses sonetos, nos passa a sua visão das coisas da vida. “Vós que sois tristes, comparai as vossas penas com as minhas penas e toda a mágoa/ que mora no vosso peito não há de igualar/ nunca metade de minha desesperação”. José Albano foi um obstinado pela linguagem clássica, não só é um influenciado por Camões, mas um consciente imitador. Assimilou o gênio camoniano com profundeza clássica e vocação lírica, e no dizer de Manuel Bandeira, justifica-se o mérito pelo apreço de José Albano à Língua Portuguesa: “tão versado em idiomas estrangeiros, prezava como ninguém a pureza do vernáculo.” O afeto e o respeito com que o nosso filólogo trata o idioma nacional, não poderíamos omitir dos ouvintes presentes apenas uma estrofe da “Ode à Língua Portuguesa”: “Língua minha dulcíssona e canora,/ Em que mel com aroma se mistura,/ Agora leda, lastimosa agora,/ Mas não isenta nunca de brandura;/ Língua em que o afeto santo influi e ensina/ E derrama e prepara/ A música mais rara —e mais divina.” De diversidade temática e de estilo José Albano nos encanta com seu extremado misticismo religioso. “Senhor, assim pregado ao duro lenho/ Não negas a ninguém o teu socorro;/ A mim, pois, que de mágoa vivo e morro,/ Dá-me o brando sossego que não tenho.” A presença de Cristo no lirismo de José Albano é uma constante. José Albano publicava sempre seus poemas em folhetos de reduzida tiragem e como utilizava pseudônimos, ora J. de A., ora Josephus Albanus, talvez esses sejam os motivos de ser José Albano pouco conhecido em toda a literatura brasileira. “Faço versos para ninguém — disse, certa vez, a João Ribeiro — porque nem a mim mesmo agradam...” Para Tristão de Athayde “José Albano viveu fora do seu tempo, viveu contra o seu tempo, viveu torturado pelo seu tempo, nessa peregrinação pela Europa, à busca de um ideal que só a chave de Camões, o grande desgraçado de gênio, lhe pôde abrir. E criou uma poesia intemporal, inespacial, realmente eterna em sua pureza intangível, em que o verdadeiro clássico, não o neoclássico, se perpetua em sua perenidade. Há um clássico eterno, como há um romântico eterno. Em geral não se entendem. Mas eu confesso que não consigo excluí-los. E creio que viverão lado a lado eternamente.” Aceitamos esta acolhida ao vosso convívio, Senhores Acadêmicos, como um INÍCIO e um DESAFIO. INÍCIO de novos deveres para com a Pátria comum e para com milhões de brasileiros que vêem seu instrumento de comunicação oral vilipendiado por malfalantes e açoitado por influências estrangeiras deformantes de suas raízes étnicas e quando muito deslizes na observância das normas gramaticais, do padrão lingüístico em desrespeito ao idioma pátrio; DESAFIO, embora vestido com a toga da humildade, de lutar sem “ESMORECER PARA NÃO DESMERECER” a fim de que a Língua Portuguesa, como instrumento máximo de unidade nacional, continue a ter, apesar do dinamismo desejado para sua sobrevivência como tal, sua identidade preservada. São as nossas considerações.” Após o discurso do Prof. José Paredes, o Prof. Antônio Martins de Araújo leu discurso do Prof. Castelar de Carvalho, que deveria fazer a recepção do novo acadêmico José Pereira da Silva, mas ficou impossibilitado de comparecer por motivo de saúde. Eis o discurso do Prof. Castelar: “Caros confrades, senhoras e senhores! Inicialmente peço desculpas pela minha ausência involuntária. Amanheci muito gripado e, no momento, encontro-me completamente afônico. Gostaria muitíssimo de estar presente entre os amigos e irmãos de fé da nossa querida Academia. O Professor Dr. José Pereira da Silva dispensa apresentações. Trata-se de nome por demais conhecido entre nós. Preparei, no entanto, estas breves palavras, no cumprimento de formalidade exigida pelo ritual acadêmico de posse. Longa e profícua é a trajetória do Prof. José Pereira como mestre de Letras. Professor, por concurso, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, leciona a disciplina Filologia Românica, com dedicação e seriedade, destacando-se o seu trabalho nas áreas de ensino, pesquisa e extensão. Havendo ministrado cursos nessas três áreas, tanto na gradação quanto na pós, tem o Professor José Pereira, na condição de docente e pesquisador, orientado Dissertações e Teses, integrado Bancas Examinadoras e proferido comunicações e conferências em diversos Congressos e Seminários, no Rio de Janeiro e outros Estados. Autor de inúmeros artigos e ensaios a respeito de sua especialidade, no momento, é Coordenador e Líder do Grupo de pesquisas CNPq , intitulado Crítica Textual e Edição de Textos, cujo objetivo é o preparo de uma edição crítica da obra de Gregório de Matos, o genial precursor de nosso Barroco, primeiro poeta do Brasil. Trata-se de tarefa ingente e árdua, devido aos óbices conhecidos, referentes aos códices disponíveis para o estabelecimento de uma edição crítica da obra do irreverente boca do inferno, melhor diríamos, boca do Brasil. Outra área em que tem se destacado o Prof. José Pereira é a do fortalecimento e divulgação da Filologia entre nós. Fundador e Presidente do Círculo Fluminense de Estudos Filológicos, tem promovido diversos Congressos de Filologia na UERJ, com a presença de nomes ilustres, como, por exemplo, o do Prof. Dr. Leodegário de Azevedo Filho, presidente desta Academia. Merece referência também seu trabalho como tradutor. Responsável pela tradução para o português do Manual de lingüística românica, de Benedek Vidos, obra clássica de especialidade, disponível até então apenas em língua estrangeira, José Pereira produziu sua versão com base nas edições espanhola e italiana. Trata-se de trabalho de fôlego, com prefácio do Prof. Dr. Evanildo Bechara, ilustre integrante desta Casa, e que representa importante contribuição aos estudos românicos entre nós. Encerrando essa apresentação, agradeço a compreensão de todos pela minha ausência. Ninguém mais do que eu está sentindo esta falta. Agradeço, em especial, ao Prof. Dr. Antônio Martins de Araújo, companheiro fraterno e paciente de árduas tarefas. Já fomos co- em tudo: na coordenação, autoria de livros, pesquisa, magistério, orientação de alunos. É a primeira vez que te faço de co-padrinho. Muito obrigado, meu irmão. Ao Prof. José Pereira formulo votos de muito sucesso entre nós nesta nova etapa de sua brilhante carreira profissional. A Academia Brasileira de Filologia só tem a ganhar com sua presença nesta casa. Seja bem-vindo, companheiro. Obrigado a todos.” Em seguida, o Prof. José Pereira fez o juramento, em que prometeu assistir regularmente às sessões da Academia, zelando pelos estudos filológicos e respeitando o estatuto da Entidade. Os símbolos da Academia, o capelo e o medalhão, foram-lhe entregues respectivamente por Antônio Martins de Araújo e Amós Coêlho da Silva. O diploma ele recebeu do acadêmico Manoel Pinto Ribeiro. Foi o seguinte o discurso de posse de José Pereira da Silva na cadeira vinte e cinco, Patrono Hemetério dos Santos: “Senhor Presidente da Academia Brasileira de Filologia, Prof. Dr. Leodegário Amarante de Azevedo Filho! Senhor Vice-Presidente da Academia Brasileira de Filologia, Prof. Dr. Evanildo Cavalcante Bechara! Senhores Acadêmicos! Prezados Alunos e Colegas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro! Meus Amigos e Parentes Convidados! Meus Senhores! Minhas Senhoras! Em três pequenas partes pretendo dividir esta oração para registrar alguns fatos dos mais importantes em minha vida: a minha existência até hoje, uma brevíssima síntese do que conheço de meu antecessor na Academia Brasileira de Filologia, o Grande Mestre Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes, e o que espero compartilhar com tão seleto grupo na vida acadêmica que agora inicio. Sou um camponês que resolveu ser intelectual, apesar da extrema pobreza de que proveio. Alfabetizado por meu pai, fui matriculado na escola oficial “para tirar o diploma”, indispensável para a continuidade aos belos sonhos ainda mal articulados. Como a elite intelectual de minha infância eram os padres e os professores, parti para o seminário, em 1964, depois de três anos de interrupção dos estudos, porque não havia ginásio em minha cidade. Por causa desse hiato, tive de cursar um ano do Admissão, ingressando no ginásio em 1965. Em 1966, animado pela inesquecível Prof.ª Excelda do Nascimento, que me doou as apostilas das Escolas Reunidas Dom Bosco de estudos por correspondência, e dispensado da presença às aulas no início do mês de outubro por já ter as notas para a aprovação, voltei a minha roça de Minas, dedicando-me por cinco meses aos estudos, juntamente com o colega de seminário, Vicente de Paula Bonfim, após os quais, em março de 1967, fiz os primeiros Exames de Madureza no Colégio Estadual de Caratinga. Retornando ao Seminário dos Padres da Congregação Vocacionista, em Itambé, na Bahia, freqüentava as aulas da segunda série ginasial, enquanto me preparava para a segunda etapa das provas dos Exames de Madureza (feitas em março de 1968) e para o Noviciado, feito na bela Ilha de Itaparica (final de 1967 a início de 1969), sob a orientação do Pe. Mestre Luiz Belopede. Depois de freqüentar o primeiro ano do Científico no Colégio Duque de Caxias, em Salvador, em 1969, retorno a Itambé para continuar o Científico e o Curso de Filosofia do Seminário, simultaneamente, lecionando ainda Língua Portuguesa no Ginásio Gilberto Viana, condição necessária para que eu pudesse fazer o curso da CADES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Docentes para o Ensino Secundário), cujos exames foram realizados em 1970, na Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. Saindo do Seminário, na Bahia, no final de 1970, vim para o Rio de Janeiro, para auxiliar minha família, que vivia uma grande crise, em Minas Gerais. Para isto, empreguei-me como professor do ensino médio na rede particular, em 1971, tentando o ingresso na rede pública. Nessa tentativa, percebi que o Registro de Professor, conseguido através de Exames de Suficiência do MEC, só tinha validade para os locais em que houvesse insuficiência de licenciados. Nos anos de 1971 e 1972, trabalhei duramente para restabelecer o equilíbrio financeiro da família, construindo uma casa para meus pais e comprando um barraco para minha residência na favela do Jacarezinho, nesta cidade. Abandonando a comprovação dos cursos feitos no Seminário, fiz os exames supletivos no Colégio Estadual José Veríssimo (concluído com média nove) e o vestibular no CESGRANRIO, para a Faculdade de Humanidades Pedro II, no início de 1973, aprovado em primeiro lugar e quase perdendo a vaga pela dificuldade em comprovar a conclusão do segundo grau. Foi naquela brilhante e mal afortunada casa de ensino superior que tive o prazer de conviver com grandes mestres como: Vandick Londres da Nóbrega, Matilde Matarazzo Gargiulo, Antônio José Chediak, Carlos Henrique da Rocha Lima, Jair de Vasconcelos Calhau e José Carlos Azeredo, entre outros. Casei-me no dia 26 de julho de 1975 com Maria Rita da Conceição, que, tomando-me o nome de Pereira, só conseguiu manter a concepção a partir de 1979, dando-me, em seguida, três filhos: Beatriz Pereira da Silva (que já me deu um neto: Ítalo Pereira da Silva, que completará um ano no dia da criança), Rita de Cássia Pereira da Silva (cujo nome é uma homenagem a minha avó paterna) e Marcílio Pereira da Silva (cujo nome é uma homenagem ao avô paterno de minha esposa). Quando o Marcílio foi concebido, eu trabalhava em cinco escolas: na Escola de Ensino Supletivo Prof. Ary Franco, no Presídio Esmeraldino Bandeira (Bangu), na Escola Alberto Monteiro de Carvalho (na favela do Jacarezinho) e em três cursos técnicos mantidos pelo SENAC: Colégio Estadual Daltro Santos (Bangu), Colégio Pedro II (Humaitá) e na Escola de Formação Profissional do Bairro da Inconfidência, em Duque de Caxias. Quando ele nasceu só me restava o emprego da rede estadual. Confiante e acostumado com o tempo sempre cheio, resolvi investir em meu aperfeiçoamento, fazendo, simultaneamente, dois cursos de pós-graduação lato sensu: o curso de “Metodologia do Ensino Superior” na Estácio de Sá e o de “Língua e Literatura do séc. XVI em Portugal”, na UERJ, onde tive os primeiros contatos acadêmicos com os mestres exemplares, Leodegário Amarante de Azevedo Filho e Jairo Dias de Carvalho, e com MarinaMachado Rodrigues e Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes, como brilhantes colegas. Terminados esses dois cursos, fui reprovado duas vezes na seleção para o mestrado em Filologia Românica, na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Sendo excluída a obrigatoriedade da Teoria Literária na seleção, fui aprovado em primeiro lugar, o que me garantiu uma bolsa do CNPq, tendo tido como colegas Ruy Magalhães de Araujo, Alfredo Maceira Rodríguez e, se não me falha a memória, Maria Thereza Francisca Isabel de Sulima Arczynska. Apresentada a dissertação de mestrado “Questões Apologéticas – edição crítica”, em maio de 1987, e aprovada por José Ariel Castro (orientador), Sylvio Edmundo Elia e Edwaldo Machado Cafezeiro, inscrevi-me para o doutorado e continuei bolsista do CNPq até março de 1992, quando defendi a tese “A Amazônia no Século XVIII: um roteiro de viagem” perante Edwaldo Machado Cafezeiro (que excelentemente substituiu meu orientador, Celso Ferreira da Cunha), Sylvio Edmundo Elia, Leodegário Amarante de Azevedo Filho, Antônio Martins de Araújo e Belchior Cornélio da Silva. Além dos nomes acima listados, eu gostaria de homenagear nesta oportunidade, a memória do estimadíssimo e sempre bem humorado Mário Camarinha da Silva, que me ensinou a técnica da pesquisa e, como Diretor da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, publicou, logo após sua apresentação à banca examinadora, a primeira versão de minha dissertação de mestrado: “A imposição da língua portuguesa aos índios. As Questoens Apologeticas do Pe. Manuel da Penha do Rosário”. Em 1991, fui aprovado por Edwaldo Machado Cafezeiro, Sylvio Edmundo Elia e Gladstone Chaves de Melo para a vaga de Professor Assistente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e no dia 21 de agosto de 1999 fui eleito para essa Academia Brasileira de Filologia, na vaga que fora ocupada por Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes. Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes marcou brilhantemente sua passagem por esta Academia Brasileira de Filologia, tendo nela permanecido menos de um ano, desde sua posse, que foi realizada com brilhantismo inigualável neste mesmo recinto, há, exatamente dezesseis meses, quando foi recebido oficialmente pelo Acadêmico Horácio França Rolim de Freitas. Sua vida acadêmica, bastante diversificada dentro da área de Lingüística e Letras, levou-o a fazer numerosos cursos de especialização e a trabalhar no magistério de primeiro, de segundo e de terceiro graus, em instituições públicas e particulares, nos Estados do Rio de Janeiro, do Paraná, do Mato Grosso e de São Paulo. Além de participar ativamente de numerosos congressos e de outras formas de reuniões científicas, Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes organizou três importantes eventos de Filologia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro: o “I Encontro de Filologia na UERJ”, o “I Seminário de Filologias Clássica e Românica” e o “II Encontro Nacional de Filologia”, não perdendo a oportunidade de homenagear os nomes mais prestimosos dessa especialidade. Como bem lembrou o Acadêmico Horácio França Rolim de Freitas, no discurso de homenagem póstuma, é graças aos esforços do incansável Carlos Alberto Short que a Academia Brasileira de Filologia está podendo organizar-se oficialmente, visto que, até recentemente, nem se sabia em que cartório fora ela registrada há nove décadas. É bastante provável que alguns de meus maiores amigos tenham planejado uma reunião secreta em algum lugar inacessível e estejam torcendo para que eu não os decepcione. Lá devem estar, sérios e reflexivos: Celso Ferreira da Cunha, Sylvio Edmundo Elia e Antônio Geraldo da Cunha, e descobrindo novos motivos para fazer sorrir: Mário Camarinha da Silva e Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes. Esta pequena constelação de astros tão brilhosos que me orientou até agora, seguramente me guiará no restante da história que ainda hei de escrever. E, já que a eles tanto devo, devolver-lhes hei o que é justo e certo, enquanto estiver a meu alcance: a manutenção de sua memória para a posteridade através da execução dos trabalhos de que já se dispensaram. Ao Prof. Celso Cunha e a Camarinha, dedicarei meus trabalhos de ecdótica e de estudos críticos de textos, como a “Edição diplomática dos códices atribuídos a Gregório de Matos” e a “Edição Crítica da Obra de Alexandre Rodrigues Ferreira”, ao A.G. Cunha dedicarei o “Dicionário Brasileiro de Fraseologia” e minha participação na comissão organizadora do “Dicionário Básico da Língua Portuguesa”, a Celso Cunha e Sílvio Elia dedicarei meus trabalhos na comissão de “Revisão da Nomenclatura Gramatical Brasileira” e ao meu colega Carlos Alberto de Araújo Martins Teixeira Short Nunes dedicarei os trabalhos que terei na organização de eventos como o “Congresso Nacional de Lingüística e Filologia”, a “Jornada Nacional de Filologia” e a “Semana de Lingüística e Filologia”. Espero cumprir todas estas promessas. E até pretendo fazer outras mais para que eu tenha coisas interessantes para fazer nos próximos cinqüenta anos. Muito obrigado!” Terminado o discurso, O Prof. José Pereira foi homenageado por seus alunos da pós-graduação da UERJ, seção de São Gonçalo. Também o Prof. Paredes foi homenageado por seus colegas da Escola de Guerra da Marinha Naval. Os novos acadêmicos convidaram os presentes para um coquetel em parte da Capela Ecumênica, reservada para esses eventos. E, nada mais havendo a tratar, foi encerrada a sessão. E, para constar, lavrei esta ata que vai assinada pelo Sr. Presidente e por mim, Manoel Pinto Ribeiro, Segundo Secretário.

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